Este blog nasceu da necessidade de falar do que penso (super clichê). Sou uma eterna estudante, mas não quero falar sobre papo cabeça, nem referenciar autores, só quero tagarelar despropositadamente.
melancolia
terça-feira, 24 de abril de 2012
Meu Doutorado
Eu escrevi esse texto há algum tempo. Queria expressar um pouco a amargura que senti com meu doutorado e as coisas que passei por lá.
Agora terminado o processo me sinto bem, leve e com muitos pontos positivos. Diante da minha insatisfação intelectual eu preenchi meu tempo com muitas viagens, muitos cursos (fotografia e afins), muitas farras e tudo que todo mundo se priva num doutorado eu usufrui, seja como forma de contrariar ou de sobreviver, não importa. O que importa é que valeu! C'est fini! E eu sou uma pessoa infinitamente melhor...
Voilà minhas divagações:
Eu estava numa situação profissional ímpar. Com dois grandes projetos financiados, muita aula, muito respeito pelos colegas e indicação para cargos de representação de classe importantes. Muita segurança e autoridade no meu campo.
Aprovada em três doutorados. Eu me boicoitei. Dos três cursos aprovada dois tinham nota 5 na capes e um nota 4. Eu escolhi o de nota 4. Eu não vejo nada demais nisso. Não gosto dessas classificações, não gosto desse produtivismo e posso me dar ao luxo de escolher as coisas por outros motivos que não o status quo da massa.
Queria conhecer uma nova região no país, queria ir para uma área, que apesar de muito criticada eu queria entender melhor. Então fui. E voltei. E nunca mais serei a mesma pessoa. Diante da saga do doutorado, que ainda não acabou e não vejo a hora de ver o final eu refleti muito, sofri demasiadamente e certamente serei uma educadora melhor. Quanto ao meu domínio técnico eu regredi, isso tbm é certo. Então não sei se vou voltar a ser pesquisadora, mas professora eu acredito serei mais consciente da minha responsabilidade e risco de acabar com o futuro de alguém.
O sentimento que eu tenho para com meu doutorado é:
Eu era um canário amarelinho que adorava cantarolar, vivia cantando sem parar. Sempre que tinha uns amigos no muro, na cerca, no fio, discutia sobre tudo e com todos e isso era intrisceco ao canarinho, essa era a vida e a rotina desse canário amarelo. Esse passarinho decidiu fazer um vôo mais longo para mudar de ares e depois voltar.
Chegou num lugar diferente, legal, estava muito empolgado e excitado com tantas possibilidades. Queria aprender outros cantos, discutir outros pontos e chorar outros prantos. Numa coisa ele tinha razão...
Chegando foi bem acolhido. Com o passar do tempo, muito pouco tempo, foi percebendo que algumas coisas não faziam sentido. Estranho. Nesse primeiro momento ele observava mais, mas falava bastante, não tanto quanto antes, mas bastante e as retaliações começaram a acontecer.
Era estranho. Depois ficou insano.
As pessoas diziam que não me viam amarelo como o grupo de canários, eu era verde limão com os pés rosa choque. E mais que isso. Eles achavam que eu não sabia qual era a cor do céu, o que se come por lá, que a chuva cai... Quando eu começava a discutir com os meus novos amigos canários e falava sobre as frivolidades da vida eles me diziam, mas é porque você não conhece o canto do sabiá, quando eu já tinha cantado com muitos sabiás, eles diziam: mas os sabiás daqui não cantam como o sabiá de lá. Eles achavam que eu não entendia as técnicas de beber o orvalho, e eu explicava que sim que sabia, mas ele diziam que o orvalho de lá eu não conhecia... Eles diziam que eu não sobreviveria ao clima de lá.
Paralelo a isso aconteceram muitas outras coisas. Eu não gosta das aulas de canto. Era tudo uma bagunça, ninguém falava de canto, falava-se de qualquer coisa, menos de partitura, entonação, floreio, prazer de cantar. Se falava muito de religião, evolução, produção, número de linhas, críticas de um professor canário a outro professor canário. Assim eram as aulas. Eu comecei a perguntar: e quando a gente vai cantar? E ninguém gostou dessa pergunta e as coisas foram piorando.
De repende eu comecei a ver que estava numa espécie de viveiro, presa, mesmo que eu tivesse um pouco de espaço. Quando eu descobri isso eu surtei. Pensei em desisti, escrevi uma carta para o outro curso de canto que tinha sido selecionado, mas não era mais possível reverter o quadro. Escolher é sempre perder. Escolher é sempre arriscar. E a vida é feita de escolhas.
Mal sabia eu que isso era apenas o começo de um fim. Porque o viveiro tinha cada dia as telas mais próximas. Eu estava ficando sem espaço. A cada manifestação eles reduziam a altura e largura do meu habitat. E eu fui parando de cantar.
Um dia quando eu tentava explicar as coisas e ninguém entendia e, antes de eu concluir, me diziam que eu não entendia as coisa porque de onde eu vim não é possível saber das coisas, eu vi que amarraram algo no meu pé. Mas eu demorei a entender o que era.
Era uma bola de ferro de prisioneiro.
Depois cortaram minhas asas.
Depois eu decidi fugir.
Eu sai, mas ainda tinha uma tornozeleira.
E agora eu não vejo a hora de me libertar.
Sei que as sequelas ficarão.
Sei que nunca mais serei a mesma.
Sei que o trauma é para os fracos, mas as tragédias nos fortalecem.
Eu, eu quase desisti de tudo. Não pela dificuldade, ou o frio, como queriam acreditar. Mas pelo tato, pelo contato, por não ser reconhecido como amarelo, por me sentir um alienigena na terra.
E eu chorei muitos e outros prantos... ... e hoje eu quase não canto...
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